Pais no Ténis de Mesa: Quando o amor se transforma em pressão
Por António Vieira Pacheco
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Convencidos de que o talento mora debaixo do próprio teto
No universo do ténis de mesa, é comum encontrar pais que acreditam firmemente que o seu filho ou filha é um talento ímpar, um futuro campeão nacional ou até internacional. Este orgulho é natural — afinal, todos queremos o melhor para os nossos filhos. No entanto, essa convicção, quando levada ao extremo, pode transformar-se numa ilusão que gera frustração, ‘stress’ e até tensões nos bastidores da modalidade.A verdade é dura, mas necessária: a
maioria dos jovens atletas não será campeã nacional, muito menos profissional.
O ténis de mesa é exigente, técnico e altamente competitivo. Requer anos de
treino, resiliência e, sobretudo, paixão genuína por parte do jovem — não
apenas projeções alimentadas pelas expectativas dos pais.
A pressão silenciosa: O peso do “tens de ganhar”
Mesmo sem dizerem diretamente, alguns
pais passam aos filhos uma pressão invisível, mas constante. Estão nas
bancadas, de olhar fixo e braços cruzados, medindo cada erro, cada ponto
perdido. O jovem, que devia estar concentrado em aprender e divertir-se,
sente-se avaliado — não só pelo treinador ou adversário, mas principalmente por
quem mais ama.
Esse ambiente de exigência, embora
motivado por boas intenções, pode sufocar o prazer do jogo, transformar o
treino num fardo e a competição num campo de batalha emocional. Muitos jovens
desistem da prática desportiva não por falta de capacidade, mas por se sentirem
emocionalmente esgotados devido à pressão contínua no ambiente familiar.
Pais nas zonas proibidas: Um problema frequente
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Chega! É hora de parar. |
Em alguns torneios de jovens no ténis
de mesa, observa-se o desrespeito pelas zonas reservadas a atletas e
treinadores — áreas técnicas essenciais para a concentração dos jogadores e a
autoridade dos árbitros. Ainda assim, por vezes, pais acabam por entrar nesses
espaços, interferindo inadvertidamente no ambiente de jogo ou nas decisões da
organização.
Isto levanta questões importantes: não
seria benéfico que os promotores garantissem a presença de um responsável de
acesso, para proteger esses espaços? E a presença de apoio médico ou de
primeiros socorros estará sempre assegurada nos eventos oficiais?
Recentemente, circulou a informação no meio da modalidade a situação de pais que levaram gelo ao filho, por
ausência desse recurso no local. Embora não se trate de um caso isolado, a
pergunta impõe-se: está garantido, em todos os campeonatos, um serviço mínimo
de apoio médico? A reflexão é válida e necessária para o futuro da modalidade.
Tudo para o meu filho: Quando a dedicação perde o equilíbrio
É inegável que o ténis de mesa
juvenil vive muito do empenho das famílias. São os pais que transportam,
alimentam, acompanham e financiam. Muitos fazem sacrifícios pessoais para que
os filhos possam competir. Porém, existe uma fronteira delicada entre ser um
apoio e transformar-se numa fonte de pressão.
Quando tudo gira à volta da
competição — a rotina familiar, os compromissos dos irmãos, os próprios
feriados —, pode criar-se um desequilíbrio emocional na criança. Esta, muitas
vezes, sente-se em dívida permanente com os pais, como se o seu desempenho fosse
a única forma de “retribuir”.
A relação com treinadores e árbitros
A interação entre pais, treinadores e
árbitros é, muitas vezes, um território sensível. É natural que os pais desejem
o melhor acompanhamento técnico e decisões justas nas provas. No entanto,
questionar decisões técnicas de forma constante, criticar treinadores ou
confrontar árbitros de maneira hostil compromete a autoridade das figuras que
orientam e regulam o desporto.
Treinadores pressionados perdem
margem de ação. Árbitros intimidados veem comprometida a sua imparcialidade. E
os jovens, apanhados no meio, crescem com a ideia de que o desporto é um palco
de tensão — quando deveria ser de superação, aprendizagem e respeito.
Como ser um pai (ou mãe) exemplar no ténis de mesa
Apesar dos desafios, há muitos pais e
mães que são verdadeiros exemplos no desporto de formação. Eles acompanham sem
invadir, apoiam sem pressionar, incentivam sem projetar.
Algumas boas práticas incluem:
- Respeitar
os espaços técnicos: evite entrar em zonas reservadas a atletas e
técnicos.
- Evitar
projeções pessoais: avalie o talento do seu filho com realismo e sensatez.
- Aceitar
derrotas como parte do processo: o insucesso faz parte da evolução.
- Confiar
no treinador: ele é o profissional responsável pelo desenvolvimento
técnico do atleta.
- Oferecer
apoio emocional, não técnico: o papel dos pais é garantir que o jovem
esteja bem, motivado e feliz.
Amor, sim, pressão não
No ténis de mesa — como em qualquer
desporto juvenil — o apoio da família é fundamental. Mas esse apoio precisa de
vir acompanhado de equilíbrio, respeito e bom senso. Amar é acompanhar,
orientar e apoiar — não invadir, substituir ou pressionar.
Só assim o desporto cumpre o seu
papel-chave: formar não apenas atletas, mas cidadãos equilibrados,
resilientes e felizes.
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