Meia-noite em Córdoba: A vitória de Francisca Jorge no limite
Por António Vieira Pacheco
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Créditos: FPT. Francisca Jorge quase derretia no calor de Córdoba, mas o 'rio' refrescou-a. |
Em Palma del Río, sob um calor
abrasador, Francisca Jorge resistiu, renasceu e voltou a brilhar, num duelo com
mais de duas horas que termina com o relógio quase a tocar a meia-noite.
Foi sob a lua quente da Andaluzia que
Francisca Jorge escreveu mais uma página de resistência, coragem e talento. A
portuguesa de 25 anos, natural de Guimarães, qualificou-se para os quartos de
final do torneio ITF W50+H de Palma del Río, na região espanhola de Córdoba,
com uma reviravolta dramática diante da búlgara Isabella Shinikova, antiga top
150 mundial.
Num encontro que se estendeu por mais
de duas horas, a número 258 do ‘ranking’ WTA não se deixou abater por um início
demolidor da adversária — e acabou a celebrar já com o relógio a beijar a
meia-noite, num ambiente tão épico quanto escaldante, com as temperaturas a
rondar os 40 graus ao longo do dia.
Derrota no primeiro ‘set’, renascimento nos seguintes
Os números do primeiro parcial eram
claros: 0-6. Shinikova entrou autoritária, impiedosa, sem espaço para dúvidas. Francisca,
por sua vez, parecia ter ficado para trás na bagagem — mas somente por
instantes. No segundo ‘set’, mostrou por que razão é uma das jogadoras
portuguesas mais respeitadas da atualidade. Manteve-se firme, recuperou o seu
ritmo e fechou por 7-5, abrindo caminho para uma terceira e decisiva partida.
Com o corpo exausto e a alma
alimentada pela esperança, a portuguesa segurou os nervos no momento certo,
venceu por 6-4 e ergueu os braços ao céu noturno da província espanhola. Não
foi somente uma vitória técnica — foi um ato de sobrevivência desportiva.
Um duelo que vale mais do que pontos
Com este triunfo, Francisca Jorge
igualou os 295 pontos da irmã mais nova, Matilde Jorge, que há pouco mais de
uma semana havia assumido, pela primeira vez, a liderança do
‘ranking’ nacional feminino.
O simbolismo é profundo: duas irmãs
separadas por somente quatro anos, unidas por uma paixão comum e agora empatadas
no número que tantas vezes mede o percurso de um atleta. No ténis português,
onde cada progresso feminino é uma conquista de fundo, este empate entre irmãs
é uma celebração rara, quase poética — como se o êxito de uma fosse sempre
também da outra.
Victoria Rodriguez: um reencontro com sabor a desforra?
Nos quartos de final, Francisca
vai medir forças com Victoria Rodriguez, atualmente número 414 do mundo. A
mexicana, que há dez anos ocupava a 216.ª posição no ‘ranking’, é uma adversária
experiente e conhecida da portuguesa — e não pelas melhores razões.
Rodriguez venceu os dois confrontos
anteriores: o primeiro em 2017, no ITF W25 da Figueira da Foz, e o segundo há
poucos meses, em dezembro de 2023, no ITF W40 de Vera Cruz. Ambos os duelos
deixaram marca, mas talvez nenhum tenha o mesmo peso que este próximo encontro.
Agora, com a confiança reforçada e a
maturidade de quem já atravessou várias fases da carreira, Francisca terá a
oportunidade de inverter a história — e, quem sabe, continuar a sua caminhada
rumo a uma final que seria tudo menos impossível.
Mais do que ténis, um símbolo de resiliência
A irmã mais velha das Jorge tem construído a sua trajetória longe dos grandes palcos mediáticos, mas com uma
consistência e uma força anímica que merecem destaque. Na terra quente de Palma
del Río, mostrou que os jogos não se medem apenas por ‘sets’ — mas sim pela
capacidade de resistir quando tudo parece perdido.
O calor foi extremo. A pressão,
imensa. Mas foi precisamente nesses momentos que Francisca encontrou o seu
melhor ténis — e deu-nos, a todos os que acompanham com esperança o ténis
português, mais um motivo para acreditar.
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