David Silva: “Darei o meu máximo para ser melhor do que era”
🖋️Por: António Vieira Pacheco
📸 Créditos: Federação Portuguesa de Badminton
⏱️ Tempo de leitura: 5 minutos
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| A infelicidade bateu à porta de David Silva na final do Nacional. |
A final individual do Campeonato Nacional de Seniores, que decorreu nas Caldas da Rainha, foi um verdadeiro espelho da alma para David Silva, vice-campeão nacional de badminton.
Aos 22 anos, viu a vitória escapar-lhe por uma lesão na
coxa esquerda no terceiro ‘set’, quando perdia por 7-5 — a segunda vez
consecutiva que sofre uma lesão numa final. Em 2024, conseguiu jogar até ao
fim, apesar da dor; desta vez, ficará afastado da competição por cerca de um
mês.
Silva falou, em exclusivo com o Entrar no Mundo das Modalidades, sobre resiliência, frustração, aprendizagem com
os erros e a motivação para continuar a perseguir os seus sonhos.
Raízes no badminton
Nascido no Funchal e residente no
concelho de Lagoa, Silva cresceu imerso no mundo do badminton. Filho de
pais que foram jogadores e treinadores, segurou a raquete pela primeira vez aos
três anos e começou a competir aos cinco, cedo mostrando talento e paixão pela
modalidade. Aos 11 anos conquistou o seu primeiro torneio nacional, marco que
transformou a brincadeira em compromisso sério.
Hoje, com disciplina e paixão,
conhece bem o preço e a beleza de se entregar totalmente a um sonho. Na final,
o corpo disse “basta” no momento decisivo, cristalizando a luta entre dor e
determinação — um instante breve, mas que revela a força física e emocional de
quem se dedica inteiramente à modalidade.
EMM — O que sentiu naquele momento em que tudo pareceu desmoronar e já não conseguia continuar?
David Silva — É uma combinação de sentimentos, o que se destaca
mais é a desilusão. Parece que tudo desapareceu num instante. Sabes que ainda
há mais por chegar, mas naquele momento pareceu que tudo acabou. Não consegui
pensar para além.
EMM — Há alguma imagem que ficou
gravada na sua cabeça?
DS — Mais do que uma. Vejo o meu irmão a levantar-se para comunicar ao
árbitro que ia desistir, o olhar da Dalila, a minha treinadora, e da minha
parceira, Marta Sousa, quando chegaram perto de mim. O ruído da bancada parecia
muito forte na minha cabeça. Tudo se amplificava naquele momento e cada segundo
mostrava durar uma eternidade.
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| O voo de David Silva. |
DS — É devastador. Tudo se mistura no momento: frustração, raiva, desespero. Fica um vácuo que engole qualquer pensamento positivo. O que me trouxe de volta foram as pessoas ao meu redor. As vozes delas tinham mais cor do que o barulho escuro dos meus pensamentos. Foi a presença deles que me permitiu respirar, reorganizar a mente e continuar a acreditar no que seguiria.
EMM — O que foi mais complicado nos dias seguintes: a dor física ou com a sensação de incompleto?
DS — Fica sempre a sensação de incompleto. A dor física era muita, mas
o desgosto que fica faz-lhe esquecer a própria dor. Antes de perceber o que o
corpo sentia, a cabeça ainda estava cheia a processar tudo o resto. É um
processo lento, mas também uma oportunidade de perceber que a mente tem um
papel decisivo na recuperação.
Lições da derrota
EMM — Que lição ficou dessa final?
DS — Aproveitar mais os bons momentos.
Apesar do nervosismo, estava genuinamente a divertir-me. Só quando soube que
não podia terminar percebi o quão divertido era. É uma lição de atenção ao
presente, de viver cada ponto e cada momento como único. Muitas vezes estamos
tão focados no resultado que esquecemos de desfrutar o processo.
EMM — Como mantém a calma durante o encontro?
DS — É difícil e nem sempre consigo, mas ao longo dos anos aprendi
estratégias. Sou uma pessoa que pensa muito, mas os pensamentos certos ficam
muitas vezes na cabeça. Uso gestos: levanto as mãos ao inspirar, baixo ao
expirar, ou serro o punho para me motivar. São sinais pequenos, mas auxiliam-me
a focar-me e a não perder o controlo, mesmo nos momentos mais tensos.
EMM — Já sentiu que joga mais com a
cabeça do que com a raquete?
DS — O badminton é muito tático. Nos momentos decisivos não penso nos
movimentos da raquete, unicamente no melhor a fazer. O corpo executa
automaticamente. A experiência ensina a confiar nas próprias decisões, mesmo
sob pressão. A mente controla a execução quase mais do que os músculos.
Confiança e recuperação
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| Voar para os Jogos Olímpicos de 2028? |
EMM — O que aprendeu com este infortúnio?
DS — Mostrou-me que não consigo estar quieto. A vontade está sempre lá. Penso constantemente no que vou fazer quando voltar, ou no que poderia
fazer mesmo neste estado. Isso é frustrante, porque ainda não posso fazer nada,
mas também revela uma força interior que me mantém motivado.
Gestos que ficam
EMM — Algum gesto do adversário que
marcou o momento?
DS — Quando ainda estava no chão, o Diogo veio ter comigo e disse-me: ‘este
é nosso’. Apesar de não acreditar nele naquele momento, foi um gesto simpático
e um bom instante. Agradeço como lidou com tudo e a consideração que
teve comigo no meio de uma grande vitória. Momentos assim mostram que o
desporto é também sobre humanidade e empatia.
EMM — O que se admira nos rivais e o que
eles admiram em si?
DS — Admiro o respeito e o trabalho deles. Todos lutamos pelo mesmo objetivo.
Às vezes parece que somos inimigos, mas há muito respeito. Espero que admirem
em mim as mesmas qualidades. Competir não é exclusivamente superar o adversário, é
aprender e também crescer lado a lado.
EMM — Como transforma a solidão
competitiva em força?
DS — Ninguém consegue competir a alto nível sozinho. Gosto de pensar que
os companheiros de treino e os treinadores estão sempre presentes. É verdade
que no momento estás sozinho, mas está ali por causa deles. A presença deles
dá confiança e energia para enfrentar desafios, mesmo quando parece impossível.
Sonhos e inspiração
EMM — Ainda há sonhos por cumprir?
DS — Claro. Quando não houver mais sonhos, paro de competir a alto
nível. Presentemente, os principais são os Jogos Olímpicos e inspirar a próxima
geração a chegar o mais alto possível. Quando era miúdo, sempre admirei muito
os melhores do badminton português. Quero ser um exemplo, assim como a geração
anterior inspirou-me. Isso dá sentido a todo o esforço e dedicação que deposito
no desporto.
EMM — Qual a mensagem deixaria aos mais
jovens sobre cair e levantar?
DS — Não importa quantas vezes cais, importa quantas vezes te
levanta. As pessoas mais bem-sucedidas erraram e tentaram de novo. Aprende com
os erros, não desista e vai ter sucesso. Cada queda é uma oportunidade de
aprender e crescer.
O futuro do badminton
EMM — Como vê a modalidade nos próximos anos?
DS — Ainda temos um longo caminho, mas estamos na direção certa. É
importante aceitar as mudanças e confiar no trabalho da federação. As pessoas
que lá estão têm paixão e querem o melhor para nós e para o desporto. Acredito
que com esforço coletivo e dedicação individual, o badminton português vai
alcançar novos patamares.
EMM — O que imagina sentir quando voltar a competir?
DS — Não sei se sentirei ansiedade, medo, felicidade ou prazer. Sei que
vou sentir uma grande vontade de dar o meu máximo para ser melhor do que era. É
a minha única garantia. Esse é o combustível que me mantém motivado durante a
recuperação e me fará voltar mais forte.
Leia também: Bruno Carvalho: “A carreira ficaria completa com a presença nos Jogos Olímpicos”.



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