Pedro Martins: O voo do volante entre as marés do Algarve
🖋️Por: António Vieira Pacheco
📸 Créditos: Federação Portuguesa de Badminton
⏱️ Tempo de leitura: 3 minutos
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| Pedro Martins, sete vezes campeão nacional e primeiro algarvio nos Jogos Olímpicos. |
Na ponta sul de Portugal, onde o sol
beija o mar com persistência, nasceu, há 35 anos, um atleta que ousou sonhar
para além da espuma das ondas. O seu nome é Pedro Martins, filho do
Parchal, Lagoa, e levantou o volante como quem ergue sonhos.
Ele escolheu um caminho improvável: o
badminton, uma modalidade ainda à margem no cenário desportivo nacional. Tal
como o vento que atravessa os pinhais de Lagoa, Pedro aprendeu cedo a mover-se
em silêncio, firme e certeiro.
Tornou-se o primeiro atleta de Lagoa
a participar nos Jogos Olímpicos, levando com orgulho as cores de Portugal ao
mais alto palco do desporto. Além disso, consagrou-se campeão nacional de
seniores por sete vezes.
Em 2020, no silêncio imposto pela
pandemia, pousou a raqueta sem mágoa, com a serenidade de quem cumpriu todos os
objetivos na modalidade.
Fica a memória do esforço, a amizade dos caminhos, e a certeza de que valeu a
pena. Na despedida não houve derrota — somente um ciclo que se fechou, com a
humildade de um campeão que soube dizer: missão cumprida.
Primeiros passos: Entre a raquete e os pinheiros
O início da sua carreira aconteceu
por um acaso. Com somente seis anos, a mãe levou-o a um treino de badminton de
surpresa. Ele gostou demasiado e ficou pela modalidade. O clube local, CHE Lagoense (mais conhecido por CHEL), foi o berço onde se moldou o
talento que levaria mais tarde as cores de Portugal a dois Jogos Olímpicos.
Naquela terra de amendoeiras e
maresia, Pedro aprendeu que a leveza do volante exigia pés rápidos, mente
afiada e uma persistência à prova de vento salgado. Não havia ilusões: tudo
seria conquistado com esforço.
De Lagoa para o Mundo
Ainda júnior, destacou-se no panorama
europeu e chegou a liderar o ‘ranking’ europeu da categoria em 2008/09. Em
2010, aos 20 anos, já estava entre os melhores do mundo em seniores: 55.º
lugar no ‘ranking’ mundial, então um feito inédito para Portugal.
Porém, o caminho não foi feito em
linha reta. Lesões, falta de apoio financeiro e a exigência de um circuito
internacional intenso tornaram cada ponto conquistado uma vitória. Pedro
nunca escondeu essas dificuldades durante a carreira em entrevistas a Órgãos de
Comunicação Social.
A travessia olímpica
Pedro Martins
representou Portugal nos Jogos Olímpicos de Londres 2012 e Rio de Janeiro,
em 2016. Em ambas as edições, foi o único atleta masculino nacional, na
modalidade, presente no certame. A participação em Londres foi o culminar de
anos de trabalho árduo, mas foi no ciclo até ao Rio que se testou a sua
capacidade de superação.
Após uma paragem por lesão, viu-se
relegado para os últimos lugares do ‘ranking’. Começou o ciclo de qualificação
para os Jogos de 2016 perto do 400.º lugar. Contra todas as
probabilidades, terminou no top-100, carimbando o passaporte para o
Brasil.
“O mais difícil foi qualificar-me,
porque muita gente não acreditava que conseguisse… Agora, tudo o que vier é
bónus”, declarou em
2016 ao Observador.
Um Algarve dentro do campo
A trajetória de Martins é espelho da
própria paisagem algarvia: resiliente como as falésias da Marinha, silencioso
como a Ria Formosa ao amanhecer, vasto como o mar que beija Ferragudo. O
Algarve, tantas vezes visto somente como destino de férias, foi também campo de
treino, escola de valores e pano de fundo de conquistas improváveis.
As praias são as primeiras
competições; os pinhais, as dificuldades do treino; o Atlântico, o mundo
competitivo que ele enfrentou. Martins jogava com a leveza da
brisa costeira, mas com a firmeza de quem cresceu a enfrentar o sol ardente de
julho com humildade e foco.
Um
legado feito de títulos e discrição
Ao longo da carreira, Pedro
conquistou 49 títulos nacionais. Venceu torneios internacionais em
países como Brasil, Marrocos, Guatemala, Uganda e Síria. Fez parte do
clube Team Argóvia (Suíça) e, mesmo em silêncio mediático,
colocou Portugal no mapa mundial da modalidade.
“Fui o primeiro atleta de Lagoa a
participar nos Jogos Olímpicos. Isso ninguém me tira!”, declarou com
orgulho ao Algarve Vivo em 2020, aquando da sua despedida
oficial.
A sua humildade era proporcional ao
seu talento. Nunca se deixou iludir pelo mediatismo, nem pelo pódio. Preferia
as palavras certas e os gestos discretos. Como quem sabe que o verdadeiro
reconhecimento é o que permanece na memória dos que o viram jogar.
A despedida
Em 2020, aos 30 anos, Martins
anunciou o fim da carreira. A decisão foi serena, sem dramatismos, como tudo o
que fez ao longo da vida:
A pandemia, o desgaste físico e
psicológico e a consciência do seu ciclo cumprido levaram-no a deixar o palco.
Mas deixou também uma marca indelével: inspirou dezenas de jovens a pegarem na
raquete, provou que um algarvio podia competir com asiáticos e europeus de
elite, e foi voz ativa na valorização da modalidade em Portugal.
Um legado que o vento não apaga
O algarvio é um símbolo do que se
pode alcançar com disciplina, humildade e fé no processo. Não teve centros de
alto rendimento, nem grandes patrocinadores. Teve a paixão, o Algarve e uma mãe
que o levou, por surpresa e instinto, ao treino certo.
Como o vento que atravessa as serras
e chega ao mar, o seu legado ecoa. Mostrou que o badminton português tem
futuro, e que o Algarve não é só férias, ou uma ‘colónia’ inglesa, ou de alemães:
também é berço de campeões lusitanos.
Leia também: Madalena Fortunato: ‘O badminton só cresce se trabalharmos em conjunto’.

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