Entre o banco e a linha de fundo
Por António Vieira Pacheco
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Créditos: FPT. André Rodeia, alguém o conhecia? |
Há histórias que nascem iguais e,
ainda assim, não se repetem. Como ecos de vidas que rimam, mas não se copiam. É
no intervalo entre o quotidiano e o sonho que se encontra André Rodeia, o mais
recente português a pisar um palco do ATP Challenger Tour — não como promessa
adolescente, nem como veterano em regresso, mas como exceção de um sistema que
não o previa.
Tem 23 anos, estudou na University of
the Pacific, na Califórnia, nos Estados Unidos. Ténis e estudos, como tantos outros. Mas ao
contrário da maioria, quando se formou, fechou a raqueta na mochila e seguiu
caminho num mundo mais estável, mais certo, mais sóbrio. Um emprego ligado ao
que estudou, dias inteiros diante de um ecrã, numa rotina de segunda a sexta,
das nove às sete — se a sorte ajudar.
“Foi uma decisão… se calhar não foi a
melhor”, confidenciou com um sorriso contido, já depois de uma derrota, por 2-6
e 1-6 clara, frente ao suíço Remy Bertola (283.º), no Jamor. Um resultado que pouco diz
sobre o essencial: o regresso inesperado de quem, por dentro, nunca se desligou
da linha de fundo.
Rodeia não é produto de apoio
federativo, nem figura em campanhas de superação financeira. Não tem o selo da
excecionalidade precoce nem o caminho alcatroado pela federação. Tem, isso,
sim, uma agenda apertada e um amor antigo. Joga ténis “com amigos” duas vezes
por semana — quando encontra quem partilhe o horário pós-laboral. “Tenho
dificuldades em arranjar alguém para treinar a partir das sete”, desabafa, como
quem fala de um amor impossível.
Mas quando a oportunidade surgiu, por
entre garfadas de um jantar familiar e um telefonema que trocou os planos da
noite, não hesitou. E o court voltou a chamá-lo — não com promessas de glória,
mas com a memória do que o fez vibrar.
“Mesmo que o dia no banco tenha sido
duro, estou sempre disponível para treinar. Até me faz bem, sair daquele
cenário onde passo o dia sentado, com o computador à frente.”
A experiência, confessa, “acendeu a chama” e abriu espaço a uma dúvida que agora o acompanha como sombra: e se for
tempo de seguir o coração?
Não sabe o que virá. Talvez mais
torneios, talvez mais jogos às escuras com amigos, talvez um salto de fé. Mas
por enquanto, o capítulo está por escrever — e a folha, pela primeira vez em
muito tempo, está em branco.
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