Maria Clara: da raquete de ténis de mesa à arte teatral e musical
🖋️Por: António Vieira Pacheco
📸 Créditos: Direitos Reservados
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| Maria Clara, a mesa tenista que se tornou atriz e cantora. |
Maria Clara, nome de batismo Maria da
Conceição Ferreira, nasceu, em Lisboa, na Travessa das Almas, a 5 de outubro de
1923. Cresceu num bairro humilde da Lapa, onde as ruas estreitas e vizinhos
atentos moldavam o quotidiano das crianças. Desde cedo, aprendeu que esforço,
amizade e criatividade se entrelaçam nas brincadeiras e nas tarefas diárias.
Aos 4 anos, já era conhecida como “rainha das rodas”, conduzindo os jogos com
naturalidade, energia e graça.
O ténis de mesa entrou na sua vida
como uma verdadeira escola de disciplina e concentração. Cada ponto jogado e
cada reflexo treinado ajudavam a desenvolver coordenação, resistência e foco
mental. Essa preparação moldou o corpo e a mente para desafios que iriam muito
além do desporto. A ginástica complementava o seu percurso, oferecendo
flexibilidade, equilíbrio e postura. Estes atributos reforçavam a elegância que
a caracterizaria em palco, sempre como complemento ao treino que moldava a sua
juventude.
Primeiros
passos no palco
Aos 9 anos, começou a frequentar o
Grupo Dramático e Escolar “Os Combatentes”, participando nas récitas infantis.
Foi aí que teve o primeiro contacto com o palco, ainda que modesto. A
disciplina adquirida no desporto transformava-se em confiança, ritmo e
expressão corporal.
Segundo a revista Stadium (2
de março de 1943), Maria Clara era:
“Uma rapariga simples e boa, com a
graça natural da mocidade sã e triunfante.”
Mesmo após alcançar fama, manteve a
humildade e o espírito da infância. Recordava os tempos de “Os Combatentes” e
confessava:
“Foi um sonho, um sonho lindo, na
verdade, mas parece-me ainda não ter acordado. Quem havia de me dizer, há um
ano, que seria agora artista? Se mo tivessem dito, teria rido com gosto.”
Recebia antigos colegas com gentileza
e afabilidade, mostrando que o desporto e as amizades da infância continuavam
essenciais. Cada treino fortalecia corpo e reflexos; cada ensaio ensinava a
ocupar espaço, transmitir emoções e conquistar a audiência. O palco tornou-se
uma extensão do ginásio, onde disciplina e talento se encontravam e
complementavam-se.
Do ténis de mesa às luzes do Teatro São Luiz
O talento chamou a atenção do Teatro
São Luiz, que a convidou para protagonizar a opereta A Costureirinha da Sé.
O sucesso foi imediato. A formação física adquirida no ténis de mesa e na
ginástica permitiu-lhe movimentos seguros, resistência para ensaios prolongados
e presença confiante em palco.
Seguiram-se discos, marchas populares
e fados suaves, culminando no título de Rainha da Rádio nos anos 50 e 60. Maria
Clara mostrou que os valores do desporto — disciplina, ritmo e perseverança —
podiam ser transformados em arte. Provou que a base do sucesso se constrói
cedo, com treino e dedicação. Cada esforço e cada repetição formavam a fundação
de conquistas futuras.
A combinação entre corpo disciplinado
e talento artístico fez dela uma intérprete segura, capaz de manter o ritmo de
ensaios exigentes e conquistar plateias com naturalidade. A ginástica
acrescentava graça e postura, mas foi o ténis de mesa que sustentou a
resistência física, rapidez de raciocínio e presença em palco.
Vida,
família e legado
Em 1948, casou-se com Júlio Machado
de Sousa Vaz, neto do Presidente Bernardino Machado. Viveu no Porto, mantendo
sempre a ligação a Lisboa que a moldou na juventude.
Foi mãe do médico psiquiatra e
sexólogo Júlio Vaz Machado, mantendo viva a tradição familiar de cultura,
estudo e dedicação. A maternidade trouxe uma nova dimensão à sua vida,
equilibrando a carreira artística com a família e mostrando que disciplina e sensibilidade
podem caminhar lado a lado.
Maria Clara faleceu em 2009, aos 85
anos, no Porto. Deixou uma herança de voz, elegância e exemplo, não unicamente
como artista, mas como mulher que transformou a disciplina desportiva em
sucesso e inspiração.
O
ténis de mesa como escola de vida
Ela demonstrou que o desporto é mais
do que competição. No ténis de mesa aprendeu ritmo, precisão e concentração,
competências que se tornariam fundamentais para a expressão artística. A
ginástica acrescentou graça, flexibilidade e equilíbrio, mas sempre como
complemento ao treino que começou com a raquete.
“Arte e desporto: duas ideias tão
ligadas e tão cheias de mesma projeção.”
(Revista Stadium, 1943)
Cada ponto, cada movimento de raquete
era uma lição silenciosa de vida. A disciplina do ténis de mesa tornou-se a
base de resistência física, agilidade e persistência, enquanto a ginástica
completava com presença elegante e harmoniosa em palco.
Celebração
dos 81 anos da FPTM
Na próxima segunda-feira, a Federação Portuguesa de Ténis de Mesa (FPTM) celebra 81 anos de história. Ela é um reflexo vivo desse percurso, pois começou a praticar a modalidade ainda antes da criação da FPTM. Das brincadeiras de rua e das primeiras raquetes de pingue-pongue, evoluiu para os grandes palcos, conquistando títulos, desafios e corações por todo o país.
Celebrar a Federação é também
comemorar todas as crianças que, como Maria Clara, encontram no desporto o
primeiro palco de conquistas pessoais, um espaço de disciplina, aprendizagem e
crescimento. Cada treino pode ser o início de uma vida de sucesso, seja no
desporto, na arte ou na ciência.
Lições
para a nova geração
Ela prova que começar nas modalidades
é também aprender a viver. Cada treino de ténis de mesa, cada salto na
ginástica ajudou-a a desenvolver habilidades essenciais para brilhar em palco e
na vida.
O seu percurso demonstra que desporto
e arte podem caminhar lado a lado. A disciplina, o ritmo e a alegria adquiridos
no treino transformaram-se em talento e expressão artística. Para os jovens de
hoje, a sua história é um lembrete de que esforço, dedicação e paixão são ferramentas
universais, válidas em qualquer desafio.
O talento constrói-se no detalhe, na
repetição silenciosa, na concentração de cada ponto, e essas qualidades
acompanham a pessoa ao longo da vida.
Um exemplo eterno
Maria Clara permanece como exemplo
eterno: uma menina da Travessa das Almas que pegou numa raquete e depois num
microfone, conquistando corações por todo o país. Do ténis de mesa ao palco, do
bairro humilde ao reconhecimento nacional, a sua vida prova que o sucesso
começa nos pequenos atos de dedicação da infância.
A sua história inspira atletas,
artistas e estudantes. O treino, a disciplina e a paixão são ferramentas para
qualquer desafio. Maria Clara mostrou que o ténis de mesa é mais do que um
jogo: é preparação para a vida, escola de perseverança, ritmo e resistência,
base sólida para qualquer futuro.
Hoje, permanece viva na memória
coletiva como símbolo de disciplina, talento e dedicação. A sua vida, iniciada
na infância, atravessa gerações. A sua trajetória prova que esforço e dedicação
são essenciais desde cedo, e que cada treino e ensaio podem abrir portas para a
vida, a arte e a cultura.

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