Portugal escorrega na Taça Davis diante da euforia peruana

🖋️Por: António Vieira Pacheco

📸 Créditos: Federação Peruana de Ténis

⏱️ Tempo de leitura: 5 minutos

Ignacio Buse celebra vitória sobre Nuno Borges em partida da Taça Davis, Lima.
Nuno Borges desiludido com a sua derrota que ditou o afastamento de Portugal na Davis.

A desilusão chamada Nuno Borges

Deitado no chão, braços abertos sobre a terra batida cor de tijolo, Ignacio Buse gritava para o céu de Lima como se cada partícula de poeira fosse cúmplice da sua vitória. Um instante depois, foi engolido pela onda vermelha e branca dos seus companheiros, que o abraçaram em círculo, enquanto as bancadas, cheias de bandeiras do Peru, explodiam em euforia. O triunfo sobre Nuno Borges (6-3, 3-6, 2-6) não foi somente uma vitória pessoal: foi o ponto decisivo que selou o 3-1 para o Peru e eliminou Portugal do caminho rumo aos Qualifiers da Taça Davis.

O duelo era mais do que um simples encontro de ténis. Representava ambições de uma nação que sonhava ver o seu melhor tenista, atual 52.º ATP, carregar a equipa nacional até ao patamar onde nunca conseguiu chegar. Mas Lima foi cruel. A festa ficou em casa e Portugal regressa com o sabor amargo da derrota.

O primeiro ‘set’: o sonho português ganha forma

O início foi promissor. Borges, ainda embalado pelo triunfo em pares ao lado de Francisco Cabral, mostrou porque é o número um nacional e figura já consolidada no circuito ATP.

Apesar de enfrentar um break point logo no jogo inaugural, o maiato recuperou a concentração e, ao quarto jogo, devolveu a pressão com um break (3-1). A confiança estava visível na fluidez das suas pancadas, ora num ‘drive’ agressivo cruzado, ora num amortie cirúrgico que deixava Buse a correr em vão.

O ‘set’ fechou em 6-3, deixando claro o contraste no ‘ranking’: Borges, top-60 mundial, contra um Buse ainda em ascensão, 112.º, mas embalado pelo título recente no Challenger de Sevilha. Parecia o guião perfeito para Portugal sonhar mais alto.

O segundo ‘set’: quando o público também joga

Foi então que Lima entrou verdadeiramente no jogo. Buse, jovem de 21 anos, ergueu os braços a cada ponto ganho, convocando o rugido das bancadas como uma arma invisível. O estádio transformou-se num vulcão em erupção, e a pressão recaiu sobre os ombros do português.

No quarto jogo, o serviço de Borges vacilou. Um par de erros não forçados, uma resposta agressiva do peruano, e o break estava consumado (1-3). No banco, Rui Machado incentivava, mas as vibrações vinham da multidão, que parecia jogar cada ponto ao lado do seu herói.

Buse consolidou a vantagem e fechou o parcial em 6-3, nivelando a contenda. Foi o momento em que o encontro mudou de cor. A confiança trocou de camisola.

O terceiro ‘set’: a queda inevitável

No parcial decisivo, Borges parecia lutar contra mais do que um adversário: enfrentava o peso das expectativas, a força das bancadas e o seu próprio desgaste. O primeiro break chegou cedo, no terceiro jogo (2-1 para Buse). A cada erro português, o estádio explodia, tornando-se um eco constante da desvantagem.

No sétimo jogo, novo break (2-5). A esperança portuguesa desaparecia lentamente, como a luz ao cair da noite. Ignacio Buse serviu para fechar a partida e, ao converter o match point, tombou no chão como quem selava não só uma vitória, mas um capítulo da história do ténis peruano.

O peso da desilusão

Para Portugal, a derrota foi um golpe duro. A ambição de chegar aos Qualifiers — porta de entrada para as Finals da Taça Davis — fica adiada mais uma vez. Em cinco tentativas anteriores, a Seleção Nacional também não conseguiu. Agora, o país permanecerá no Grupo Mundial I, sem conseguir dar o salto que se deseja há anos.

Para Nuno Borges, o desfecho tem um peso especial. Era o pilar da equipa, o favorito natural, o homem em quem repousavam as esperanças. Mas, na Taça Davis, os ‘rankings’ muitas vezes pouco significam. A atmosfera, a pressão e a energia nacional transformam encontros previsíveis em batalhas imprevisíveis.

A festa do Peru

Se para Portugal ficou a frustração, para o Peru ficou a festa. Ignacio Buse não venceu sozinho. Foi carregado por uma nação que encheu as bancadas, transformando o Clube Lawn Tennis de La Exposición num caldeirão de emoção.

Ao cair de joelhos e ser rodeado pelos companheiros, Buse encarnou o espírito da Taça Davis: não é apenas ténis, é identidade nacional, é bandeira ao peito, é viver cada ponto como se fosse o último.

Reflexões sobre a Taça Davis e o futuro português

A derrota deve servir de reflexão. Portugal conta com jogadores de talento — Borges, Jaime Faria, Henrique Rocha e Francisco Cabral — mas continua a esbarrar em momentos decisivos. A falta de profundidade, a dificuldade em lidar com ambientes hostis e a ausência de resultados consistentes em competições de equipas são feridas abertas que precisam de atenção.

O próximo ciclo será determinante. Com Borges no auge da carreira e jovens como Faria e Rocha a evoluir, há espaço para crescimento. Mas é preciso mais: planeamento, apoio federativo e uma cultura de crença coletiva que transforme o talento em conquistas.

Lima como metáfora da desilusão

Lima ficará na memória como o lugar onde Portugal sonhou e acordou bruscamente. Onde um favorito caiu diante da coragem de um jovem inspirado. E onde uma chave para os Qualifiers voltou a escapar por entre os dedos.

A imagem final é cruel: Borges, cabisbaixo, a arrumar o saco de raquetes, enquanto ao fundo ecoava a alegria peruana. Uma metáfora perfeita da linha ténue entre glória e desilusão no desporto.

Portugal continua à espera da sua vez. Mas, como em todas as derrotas, pode haver lições. A Taça Davis não se joga somente com pancadas de direita e esquerda. Joga-se com coração, alma e, acima de tudo, com a capacidade de transformar frustrações em força para voltar mais forte.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

José Santos, o árbitro mais antigo do ténis de mesa

Gilberto Garrido é um farol da Madeira

FPT continua em festa