Telma Santos: A rainha do badminton


🖋️Por: António Vieira Pacheco

📸 Créditos: Arquivo de Telma Santos 

🎥 Créditos RTP e João Boto

Telma Santos é a melhor portuguesa de sempre.
Telma Santos esteve presente em duas edições dos Jogos Olímpicos.

No mosaico do desporto português, há nomes que brilham por resultados e outros por legado. Telma reúne ambos. Natural de Peniche — cidade onde o mar molda a paisagem e o carácter — carrega no peito a força da sua terra. 

Neste 42.º aniversário, o Entrar no Mundo das Modalidades presta-lhe homenagem com este retrato da sua jornada.

Mais do que uma atleta, um símbolo

Telma continua a manter a forma.
Ela jogava, nós vibrávamos! Suor e boa disposição!
Telma Santos continua a manter a forma. Quando jogava, o público vibrava com as suas jogadas, com suor e com boa disposição. 

Ex-atleta olímpica, representou Portugal nos Jogos de Londres, em 2012, e Rio de Janeiro, em 2016. Hoje, é selecionadora nacional, liderando com a mesma paixão com que jogava.

No seu olhar habita a impetuosidade das ondas e, no íntimo, a serenidade das marés. Essa dualidade — intensidade e doçura — reflete-se na forma como vive o desporto: com garra e humildade.

Telma nunca foi somente jogadora. Nem é “só” treinadora. É uma inspiração para os jovens atletas, um farol de superação e entrega. Uma navegante que venceu tempestades — no campo e na vida. É a rainha do Badminton de Portugal.

O início de uma paixão

A modalidade entrou cedo na sua vida, em 1992, no Stella Maris, de Peniche. A influência do tio, Fernando Silva — também ele praticante olímpico em Barcelona 1992 — despertou-lhe o interesse. Desde então, foi paixão à primeira raquete e também ao volante.

O apoio da família foi âncora e bússola. Num país onde o badminton ainda é uma modalidade pouco visível, esse suporte foi crucial.

Para Telma, o badminton não era somente um desporto. Era uma forma de estar, uma escola de resiliência.

Campeã mundial em 2021 em mais de 35 anos.
Mente focada, coração em jogo. Telma Santos, serena e intensa, jogava com alma e estratégia.

Trabalho, não rótulos fora do campo

Apesar de ser vista por muitos como a “rainha do badminton português”, Telma mantém a humildade e os pés bem firmes no chão.

“Nunca me vi como ‘a rainha’ do badminton português. Sempre percorri o meu caminho com trabalho, dedicação e paixão pela modalidade”, afirmou em exclusivo ao Entrar no Mundo das Modalidades, a partir do Brasil.

Ela acrescenta que nunca procurou reconhecimento fora dos campos:

“Se inspirei outros, fico naturalmente feliz, mas nunca joguei por títulos fora do campo.”

Hoje, continua a marcar presença. Já não empunha a raquete em competição, mas ergue a voz para motivar, orientar e formar:

"Sinto orgulho por representar Portugal nos Jogos Olímpicos e, agora, por contribuir para levar o badminton mais longe."

Uma carreira de conquistas

Telma representou vários clubes ao longo da carreira: Stella Maris, União de Santarém, Grupo Desportivo do Estreito, CHE Lagoense, Vendsyssel (Dinamarca) e IES La Orden, de Huelva (Espanha).

Telma Santos é recordista de títulos em campeonatos nacionais.















A nativa de Peniche conquistou 12 títulos de Campeã Nacional de Absolutos (2001, 2002, 2003, 2005–2010, 2012–2014), um marco raro no desporto português. 

Este recorde absoluto, alcançado em 2014, superou a marca (11) anteriormente detida por Isabel Rocha e consolidou-a como a atleta mais titulada da história da competição.

Internacionalmente, Telma somou 15 vitórias e sagrou-se vice-campeã por 5 vezes.

                                          Telma em entrevista à RTP em 2016. Ouça.

Entre os seus maiores momentos, está a conquista dos Internacionais de Portugal em 2010 — um marco na sua projeção internacional.

Na altura, festejou de joelhos, emocionada, perante o público lusitano que vibrava com o seu feito.

Mas os momentos mais emblemáticos foram, sem dúvida, os Jogos Olímpicos. Neles, Telma foi mais do que uma atleta: foi embaixadora do badminton português.

Após a competição, um conflito judicial com a Federação interrompeu a sua trajetória na seleção e acabou por afastá-la da corrida rumo a Tóquio.

Hoje, atua como treinadora e partilha a sua experiência com jovens talentos como Tiago Berenguer, Alexandre Bernardo, Mafalda Avelino e Maribel Sousa. Estes atletas são vistos como promessas da modalidade e símbolos do futuro.

Campeã também depois dos 35

Telma conquistou o título eurpoeu de mais 40.
Telma no degrau mais alto do pódio.
A excelência de Telma não terminou nessa altura. Em 2021, sagrou-se campeã mundial na categoria +35, vencendo a búlgara Maya Dobreva com um expressivo 21-12 e 21-7. Um tributo simbólico ao legado do seu tio Fernando Silva

Ela, nessa altura, conciliava o prazer de jogar com a de treinadora.

Em 2024, foi campeã europeia na categoria +40. Uma prova de que o talento, quando sustentado pela dedicação, não tem prazo de validade.

Liderança com alma

Em novembro de 2024, iniciou um novo capítulo na sua carreira ao ser convidada por Duarte Gil Anjo, então único candidato à presidência da Federação Portuguesa da modalidade, para integrar o corpo técnico da seleção nacional.

“A transição foi desafiante, mas, ao mesmo tempo, muito gratificante”, admite.

Confessa ainda que não esperava um convite tão cedo: 

“Para ser honesta, não era nada que tivesse planeado. Não esperava terminar a minha carreira e receber, praticamente de imediato, um convite. Foi inesperado, mas também um sinal de confiança que me tocou muito”, profere emocionada.

Essa mudança trouxe-lhe também uma nova forma de viver o badminton.

“Passei de viver o badminton com um foco muito pessoal — os meus treinos, os meus objetivos — para olhar com um sentido mais coletivo e com responsabilidade sobre o percurso dos atletas”, explica.

E acrescenta: “Hoje, continuo a viver o badminton com a mesma paixão, mas de forma diferente.”

Com humildade, reconhece ao Entrar no Mundo das Modalidades que este é um percurso em construção:

"Tenho muito a aprender, e tanto eu como toda a nossa equipa técnica precisamos de tempo para trabalhar. E isso, de certa forma, até reforçou a minha ligação ao badminton."

Os desafios dos jovens atletas rumo ao alto rendimento

Questionada sobre os maiores obstáculos que os jovens atletas portugueses enfrentam atualmente para alcançar o alto rendimento no badminton, foi clara e objetiva:

“Destacarei três grandes desafios: a falta de competição de alto nível com regularidade, a dificuldade em conciliar a escola, os treinos e a vida pessoal, e a escassez de estruturas para apoiar este percurso.”

Para a selecionadora nacional, o esforço da Federação é reconhecido — como a criação dos polos de treino UAARE/PAAR e o trabalho no CAR das Caldas da Rainha.

Telma destaca os avanços recentes nos programas de treino em Portugal.

“Estes projetos têm oferecido contextos de treino mais exigentes, estruturados e cada vez mais alinhados com aquilo que se faz internacionalmente”, explica.

Ainda assim, ela aponta uma lacuna importante: 

“Falta algo fundamental que gostava muito de ver acontecer um dia: termos, à semelhança de países como Espanha, os nossos melhores atletas a treinarem juntos diariamente, num ambiente de excelência e competitividade constante.”

A comparação com a realidade de outros países europeus é inevitável. A guerreira de Peniche sublinha que a diferença começa a sentir-se desde cedo, com os atletas estrangeiros a terem acesso a centros de treino de excelência, acompanhamento técnico diário e um contexto desportivo naturalmente mais competitivo.

“Em Portugal, ainda construímos esse caminho, passo a passo, mas é preciso tempo, visão e investimento”, afirma.

Ela reforça que a dedicação dos atletas é essencial para o sucesso: 

“Acima de tudo, também é preciso que os próprios atletas acreditem no processo e estejam dispostos a escolhas difíceis pelo desporto se quiserem realmente apostar no alto rendimento.

As palavras da treinadora são um alerta e, ao mesmo tempo, um convite à reflexão. O talento existe, mas o contexto precisa de ser fortalecido. 

Competição regular, estruturas consolidadas, investimento estratégico e uma cultura de exigência são, segundo a ex-atleta, os pilares que podem levar o badminton português a um patamar mais elevado.

No fundo, trata-se de criar as condições para os jovens poderem sonhar mais alto e, sobretudo, acreditar que é possível chegar lá. 

Telma explica quais são as qualidades que a equipa técnica procura nos atletas mais jovens.

“Nos escalões mais jovens, valorizamos sobretudo a atitude, a curiosidade em aprender, a capacidade de escutar e evoluir, e o entusiasmo com que vivem cada oportunidade”, destaca.

Ela acrescenta que, nesta fase, o foco está mais na formação do que exclusivamente nos resultados:

“Por isso, damos muita importância à margem de progressão, à vontade de treinar, ao comportamento dentro e fora do campo, e à forma como lidam com os outros.”

Quando se trata dos atletas mais experientes, a selecionadora admite que o nível de exigência sobe.

“Nos mais crescidos, olhamos com mais atenção para a consistência competitiva, os resultados, a disciplina e a capacidade de aguentar pressão e responsabilidades”, revela.

Telma também valoriza a atitude de superação:

“Gosto de atletas que se desafiam e desafiem-me, que tenham compromisso, que respeitem o processo e os treinadores e queiram representar Portugal com orgulho.”

A selecionadora reforça que não procura somente quem vence mais jogos, mas quem demonstra carácter e espírito de equipa:

“Queremos atletas que queiram crescer, que tenham espírito de equipa e que não desistam nos momentos difíceis”, sublinha.

A técnica acrescenta que a determinação diária é um fator-chave: 

“Valorizamos quem treina com determinação e objetivos com perfil competitivo para estar num grupo de alto rendimento.

“Para mim, isso é ser um verdadeiro atleta de seleção”, conclui.

Telma conduz os atletas com a segurança de quem conhece o mar. Como uma timoneira experiente, sabe quando ajustar o leme, quando acelerar e quando esperar a maré certa.

Telma Santos e Tiago Santos. O passaso, o presente e o fututo juntos.

Telma e Tiago Berenguer: passado, presente e futuro unidos pelo badminton português.

Uma beleza serena

Discreta, acessível, simpática, Telma irradia uma beleza silenciosa, como a luz suave sobre o oceano. O seu sorriso é farol e abrigo. A sua presença, um bálsamo que inspira confiança.

Quem com ela cruza caminho reconhece-lhe a generosidade e o cuidado com que partilha o seu conhecimento. É no gesto despretensioso, no olhar genuíno, que reside com a sua força.

Um legado que transcende o campo

Telma é mais do que campeã. É exemplo. A sua trajetória prova que o desporto é mais do que competição — é forma de estar, arte de viver, caminho de superação.


Esta senhora de Peniche demonstrou que, como as ondas, a persistência molda o destino. Não é unicamente uma atleta na história: é parte da identidade do badminton em Portugal.

Agora, enquanto selecionadora, ajuda a moldar as próximas gerações. Ensina-lhes que, como o mar, também elas podem ser inflexíveis, tenazes e generosas.

Parabéns, Telma Santos, pelos 42 anos de vida.

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